Ácidos orgânicos na avicultura e sua atuação como promotores de saúde intestinal

Warley Alves

Analista de Desenvolvimento de Nutrição de Aves

13 agosto 2024
-
6 minutos

A integridade intestinal é essencial para garantir a saúde, o desempenho produtivo e o bem-estar das aves na avicultura. Nos animais, o trato intestinal não é apenas o local para a digestão e absorção de nutrientes, mas também o maior órgão imunológico para a proteção do corpo contra desafios adversos, como bactérias patogênicas infecciosas, vírus e parasitas. Portanto, é crescente a necessidade em todo o mundo de explorar estratégias capazes de manter a integridade da morfologia intestinal e modular a função intestinal. Nesse sentido, alguns aditivos alimentares e minerais podem influenciar positivamente no desenvolvimento da mucosa intestinal, ajudando a manter a saúde intestinal, melhorando a digestão e absorção dos nutrientes. Para favorecer a saúde intestinal existem muitos produtos disponíveis, que podem ser adicionados via água ou ração. Entre estes temos os aditivos, probióticos, prebióticos, enzimas, óleos essenciais, ácidos orgânicos e aminoácidos, como a glutamina, além de alguns minerais, como o cromo.

Como melhorar a saúde intestinal do meu plantel?

Por Warley Alves, Analista de Desenvolvimento de Nutrição de Aves

Compreendidos como compostos que contêm um ou mais grupos carboxila (COOH) ligados a uma cadeia de carbono, os ácidos orgânicos podem ser classificados de acordo com o comprimento de sua cadeia de carbono, seja em ácidos de cadeia curta, média ou longa. Os ácidos de cadeia curta têm até seis átomos de carbono, incluindo exemplos como ácido acético (C2) e ácido propiônico (C3), com aplicações comuns na conservação de alimentos e na nutrição animal devido às suas propriedades antimicrobianas. Já os ácidos de cadeia média têm de 7 a 12 átomos de carbono em sua estrutura, como o ácido caprílico (C8) - conhecido por suas propriedades emulsificantes e antimicrobianas, sendo amplamente utilizado na indústria alimentícia e de cosméticos. Por fim, os ácidos de cadeia longa contêm mais de 12 átomos de carbono, como o ácido esteárico (C18), comumente encontrado em gorduras animais e vegetais, e utilizado na produção de sabões, cosméticos e produtos farmacêuticos. Esta classificação baseada no comprimento da cadeia de carbono influencia suas propriedades e aplicações em diversas indústrias.

Os benefícios do uso de ácidos orgânicos na alimentação de aves estão diretamente ligados à melhoria da morfometria intestinal, como o aumento das vilosidades e da profundidade das criptas. Estas mudanças estruturais promovem uma maior superfície de absorção de nutrientes, melhorando a eficiência digestiva e a saúde geral das aves. Além disso, os ácidos orgânicos ajudam a fortalecer a integridade da mucosa intestinal, criando uma barreira mais eficaz contra patógenos e toxinas. Este fortalecimento da barreira intestinal reduz o risco de infecções, como as causadas por Salmonella e Escherichia coli, melhorando a resistência imunológica das aves. A combinação destes efeitos resulta na melhoria do ganho de peso e eficiência alimentar do plantel, contribuindo para uma produção avícola mais saudável e produtiva. Além disso, os ácidos orgânicos, especialmente os de cadeia curta, desempenham um papel importante na redução do desenvolvimento de microrganismos patogênicos ao acidificar o ambiente intestinal, tornando o meio menos favorável para bactérias nocivas.

 

Um dos ácidos orgânicos com maior destaque neste contexto é o ácido butírico. Este ácido de cadeia curta é particularmente eficaz em promover a saúde intestinal das aves e estimular a proliferação e diferenciação celular epitelial, bem como o aumento do fluxo sanguíneo, além de ser a principal fonte de energia para as células epiteliais intestinais. Ele atua diretamente na expressão gênica, na síntese proteica, e no aumento da altura das vilosidades e profundidade das criptas do intestino, o que amplia a área de absorção de nutrientes. O ácido butírico também fortalece a integridade da mucosa intestinal, funcionando como uma barreira protetora contra patógenos e toxinas. Suas propriedades antimicrobianas inibem o crescimento de bactérias patogênicas, através da acidificação do ambiente intestinal e da alteração da permeabilidade das membranas celulares dos microrganismos. Além disso, o ácido butírico estimula o crescimento de bactérias benéficas, como Lactobacillus e Bifidobacterium - essenciais para a digestão eficiente e saúde intestinal. A inclusão do ácido butírico na dieta das aves, portanto, não só melhora a digestibilidade e a absorção de nutrientes, mas também promove um ganho de peso superior e uma melhor eficiência alimentar.

 

Benefícios do ácido butírico para a saúde intestinal

A saúde intestinal ideal pode ser caracterizada por diferentes indicativos. Um deles é a relação entre a altura das vilosidades e a profundidade da cripta. Uma alta proporção indica vilosidades maduras e funcionais, com uma cripta rasa que constantemente promove a renovação celular. A melhora da saúde intestinal também tem sido atribuída ao aumento do comprimento do TGI, possibilitando maior absorção. O ácido butírico pode aprimorar o desenvolvimento das células epiteliais e preservar eficazmente a viabilidade celular, aumentando o turnover de enterócitos e melhorando a recuperação intestinal. Teoriza-se que os ácidos graxos de cadeia curta tenham vários mecanismos de atividade antimicrobiana. Um dos mecanismos mais amplamente aceitos pelos quais o ácido butírico pode destruir bactérias patogênicas e expressar sua atividade antibacteriana é a alteração do pH interno do micróbio (despolarização), interrompendo a síntese, transporte de nutrientes e o metabolismo energético do micróbio. Além disso, a redução do pH luminal também é benéfica, estimulando o crescimento de bactérias benéficas e dificultando o crescimento de bactérias patogênicas. É comum que o crescimento de patógenos ocorra no TGI quando o lúmen do intestino delgado e do ceco excede um pH de 5,8–6,0, e no intestino grosso, quando o pH excede 6,2. Foi sugerido que o aumento significativo das vilosidades seja devido à redução no crescimento de bactérias patogênicas e não patogênicas, diminuindo a colonização e as respostas inflamatórias da mucosa intestinal.

 

Imunidade

O ácido butírico exerce um impacto positivo na imunidade das aves através da promoção da eubiose intestinal, equilibrando a microbiota. Ele aumenta o número de bactérias benéficas, limita a colonização de patógenos e melhora o pH intestinal, todos esses fatores contribuindo positivamente para as respostas imunológicas das aves. Estudos demonstraram que a inclusão de ácido butírico na dieta das aves melhorou as respostas imunes mediadas por células, evidenciadas pelo aumento na resposta à fitohemaglutinina-P em frangos 48 horas após a inoculação. Além disso, observou-se uma melhora na imunidade humoral, com maior produção de anticorpos após vacinação contra a doença de Newcastle e injeção de hemácias de carneiro. Esses benefícios se refletem também em um melhor desenvolvimento do sistema linfático, com aumento do peso do timo e do baço, bem como uma estrutura mais robusta do timo medular e dos centros germinativos do baço. O ácido butírico também promove o desenvolvimento intestinal saudável, aumentando tanto o comprimento quanto a profundidade das vilosidades intestinais, além de estimular a produção de células caliciformes que contêm mucinas ácidas.

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Parâmetros de desempenho

Vários efeitos positivos sobre os parâmetros de desempenho, como ganho de peso e conversão alimentar, em frangos de corte e poedeiras são creditados ao ácido butírico. Estudos observam que os ácidos orgânicos, incluindo o ácido butírico, reduzem significativamente a mortalidade quando comparados aos controles. Contudo, é importante salientar que os resultados variam segundo o nível de inclusão e as formas de ácido butírico utilizadas. Além disso, as pesquisas frequentemente apresentam contradições devido ao tipo de dieta e às formas de butirato (como sal de cálcio, sal de sódio, glicerídeo, entre outros). Em suma, a melhoria no desempenho das aves pode ser atribuída ao papel do ácido butírico no fortalecimento da barreira intestinal, fornecendo energia aos colonócitos, promovendo a diferenciação e maturação das células intestinais, melhorando a eficiência alimentar e promovendo uma resposta imunológica positiva.

Aproveitamento dos nutrientes

A suplementação de ácido butírico pode aumentar a solubilidade da ração, a digestão e a absorção de nutrientes.  Diversos trabalhos disponíveis na literatura relatam o aumento da digestibilidade de cálcio, fósforo, magnésio, zinco e proteína com o fornecimento de ácidos orgânicos via dieta, evidenciado pelo aumento das concentrações séricas de cálcio e fósforo em frangos que receberam esses compostos. Esses resultados são atribuídos à formação de complexos entre íons ácidos e minerais como cálcio e fósforo, o que aumenta sua digestibilidade. Outro efeito positivo dos ácidos orgânicos é sua atuação como substratos para o metabolismo intermediário.

Além disso, com a redução das bactérias patogênicas, graças aos ácidos orgânicos, a demanda metabólica microbiana é diminuída, deixando mais nutrientes disponíveis para absorção. A diminuição das toxinas produzidas por bactérias nocivas também pode aumentar a disponibilidade de energia e a digestibilidade das proteínas. Sugere-se que o aumento da digestibilidade das proteínas ocorra devido à redução do pH gástrico pelos ácidos orgânicos na dieta, resultando em maior atividade da pepsina. A proteólise das proteínas pela pepsina libera peptídeos que desencadeiam a liberação de hormônios como CCK e gastrina, os quais desempenham um papel significativo na digestão e absorção de proteínas.

Qualidade dos ovos

A manutenção da qualidade do ovo pode ser alcançada com a conservação da resistência à quebra e a espessura adequada da casca, bem como pelo bom tamanho do ovo. Para produzir cascas fortes, as galinhas devem consumir a proporção correta de manganês, vitamina D, cálcio e fósforo. Entretanto, à medida que envelhecem, as células da mucosa no duodeno enfraquecem, as vilosidades começam a encurtar, e a absorção no intestino delgado diminui, resultando na perda da qualidade da casca do ovo. Como paliativo, foi sugerido que a redução na resistência da casca do ovo em galinhas mais velhas pode ser amenizada com o uso de butirato, resultando em aumento da força da casca do ovo e diminuição de ovos malformados. Isto porque, como já dito, o butirato melhora o metabolismo e a absorção de cálcio, fósforo, magnésio e zinco. A formação de uma casca de ovo normalmente requer que os minerais sejam liberados da glândula da casca nas proporções certas e no momento certo para garantir a boa qualidade da casca do ovo. Portanto, a absorção e o metabolismo adequados de nutrientes são essenciais para atingir esse estado fisiológico. Além disso, os ácidos orgânicos aumentam significativamente a espessura da casca do ovo e a redução do pH da dieta, o que também pode beneficiar a qualidade da casca do ovo.

Considerações finais

Em síntese, a manutenção da saúde intestinal das aves é fundamental para a avicultura moderna e a utilização de ácidos orgânicos tem se mostrado uma estratégia eficaz neste contexto. Estes compostos não apenas melhoram a morfometria intestinal, aumentando a altura das vilosidades e a profundidade das criptas, mas também fortalecem a integridade da mucosa intestinal, criando uma barreira mais eficaz contra patógenos e toxinas. O ácido butírico em particular, destaca-se por seus múltiplos benefícios, incluindo a promoção da saúde intestinal, a inibição do crescimento de bactérias patogênicas e a estimulação de bactérias benéficas essenciais para a digestão eficiente.

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